A ocupação do plenário da Câmara de Vereadores por cerca de 300 representantes do candomblé alterou a rotina da Casa nesta segunda-feira, 6. O protesto contra o projeto de lei que proíbe o "sacrifício" de animais em cultos religiosos, de autoria do vereador Marcell Moraes, transformou a sessão regular em especial.
O protesto também resultou em uma reunião extraordinária da Comissão de Constituição, Justiça e Redação Final que vai acontecer nesta terça, 7, às 11 horas. A previsão é que a comissão declare o projeto de lei inconstitucional.
O vereador Alfredo Mangueira (PMDB), membro da Comissão de Constituição e Justiça, disse que durante a sessão da tarde vai propor votação no plenário para veto definitivo ao projeto.
"O Artigo 144 do regimento interno da Câmara determina a presença do autor, mas abre exceção se o plenário decidir o contrário. Significa que a votação pode ocorrer mesmo com a ausência do vereador Marcell Moraes", explicou Mangueira.
Moção - Os manifestantes começaram a ocupar a Câmara às 14 horas, uma hora antes do início da sessão desta segunda. "O vereador acendeu o estopim com uma atitude irresponsável", disse tata Eurico Alcântara, membro do Núcleo de Religiões Afro-Brasileiras da Polícia Militar (Nafro-PM).
"Até 1976 a gente tinha que pedir autorização policial para realizar cultos. Não se pode regredir. É um ato criminoso", disse o presidente da Associação Cultural de Preservação do Patrimônio Bantu (Acbantu) Tata Konmannanjy.
A ocupação começou na galeria e tomou conta do Plenário Cosme de Farias. O protesto foi feito ao som dos cânticos, acompanhados pelos atabaques.
Autor do projeto polêmico, o vereador Marcell Moraes optou por abandonar a sessão. "Ninguém quer me ouvir. Fui mal interpretado. Sou contra a matança de animais que não irão servir de alimento e o candomblé não faz isso", explicou o vereador alegando desconhecer a denominação religiosa que utiliza a prática que condena.
Ao sair para esperar o término da sessão na sala da presidência, Marcell foi abordado por ebomi Nice de Oyá, sacerdotisa do terreiro Casa Branca. "Peço que retire o projeto. Não faça isso com o povo de santo. Quero acreditar na sua dignidade", completou.
Integrantes da ONG ambientalista Geamo, coordenada por Marcell Moraes, levaram cartazes em defesa da proposta. "O candomblé não faz isso, mas as pessoas não entenderam o projeto", disse Tainara Ferreira, 21 anos.
Também defensora da causa animal, a vereadora Ana Rita Tavares é favorável à retirada da proposta. "Sou vegetariana e contra qualquer tipo de sacrifício, mas acredito na mudança de postura pelo convencimento e não pela imposição. Nunca iria propor um projeto assim".
O caráter inconstitucional já seria o suficiente para vetar a proposta, segundo o vereador Sílvio Humberto. "Além de inconstitucional, é intolerante e indefensável".
Para a makota Valdina Pinto, a discussão vai além da religiosidade. "O candomblé não é só religião. Preserva toda a cultura e a identidade dos povos africanos que construíram essa cidade".
Presidente do Conselho de Desenvolvimento da Comunidade Negra (CDCN), a socióloga Vilma Reis mencionou uma moção de repúdio ao vereador hospedada no site Petição Pública.
Até o início da noite desta segunda, o documento já tinha 155 assinaturas. "Precisamos combater essas posturas racistas e intolerantes. Nossas práticas não são medievais, são milenares e compõem uma história", disse Vilma.
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